quarta-feira, 10 de junho de 2015

NÃO MATEM A GALINHA DOS OVOS D’OURO


Temos um potencial catalisador de energias que ainda não soubemos explorar. Existem alguns casos pontuais que emergiram de condicionantes específicas como é o caso do Algarve, Douro e Lisboa, como polos de turismo conhecidos a nível mundial, principalmente fruto dos baixos preços praticados, mas não das sinergias que podem gerar.
O clima, as belezas naturais, a boa maneira de recebermos, a gastronomia tipo mediterrânica e o património material e imaterial, são, entre outros, alguns fatores que devemos aproveitar e preservar para desenvolver um turismo sustentado e de qualidade que atraia os turistas estrangeiros a visitarem o nosso país e os nacionais a escolherem destinos internos que rivalizam em beleza com os melhores a nível mundial.
É no turismo e na nossa capacidade de trabalho que está a galinha dos ovos d’ouro que devemos olhar como esperança para o futuro. A criação de um turismo integrado que abranja todas as áreas duma forma equilibrada e sustentada, sem atentados que degradem o ambiente, o património, a gastronomia, preservem e melhorem a nossa maneira simpática e cordial como sabemos receber, são aspetos importantes que devem ser tomados em atenção e defendidos por todos nós. Vamos estimar aquilo que temos e encontrar formas de o por a render em benefício próprio e da humanidade, partilhando-o com quem nos visita, tirando dividendos úteis dessa partilha que nos foi legada.
Ultimamente, com o crescendo de turistas a visitar as duas cidades mais importantes do país (Lisboa e Porto), tem surgido a apetência para cobrar taxas de entrada nos portos e aeroportos. Estamos a matar a galinha dos ovos d’ouro. O turista quer ser bem recebido com um serviço eficiente e normalmente não reclama o que paga por esse serviço quando bem informado, mas não gosta de pagar impostos que cabem aos outros. É justo que o turista pague a pegada ecológica (turística), mas não lhe devemos mostrar a taxa que cobramos diretamente. Essa taxa deve estar incluída e camuflada na fatura global e não autonomizada parcelarmente, originando que o utente inquira o porquê dessa taxa.
Outro imposto que está a matar a galinha dos ovos d’ouro é o IVA de 23% aplicado na restauração, 10 pontos acima do valor médio, que mata a qualidade e desmotiva o turista a provar a nossa gastronomia, afastando-se dos restaurantes, evitando assim que publicitem as nossas iguarias que podiam ser um embaixador e um sustentáculo económico. O homem não vive sem beber e comer. A cadeia alimentar, até a comida chegar à mesa, gera emprego para muitas pessoas e fixa as populações nas suas origens sem o êxodo para as grandes cidades.  
O surto turístico registado nos últimos anos, atingiu o máximo em 2014 (10.394 milhões de euros) e perspetiva-se que aumente em 2015, contudo, segundo a AHRESP (Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal), cerca de 60% do setor encontra-se em risco de falência, motivado pelo aumento do IVA (13% para 23%) que as empresas num período de deflação não refletiram os preços ao consumidor, suportando esse aumento através das margens e capitais próprios, atirando a capacidade financeira dessas empresas para os níveis mais baixos de sempre. De 2008 (início da crise) para cá, perderam-se cerca de 44.000 postos de trabalho (320.000/276.000), sendo significativo que no 4º trimestre de 2014 desapareceram perto de 26.000. Os preços estão ao nível de 2008 sendo quase impossível as empresas manterem a sua atividade.
Outro aspeto a considerar é a taxa do IVA (23%) aplicada ao vinho do Porto (o nosso maior embaixador) que impede os turistas de levar uma recordação, apesar das inovadoras formas encontradas pelas marcas de comercializarem o produto, face às exigências das transportadoras «low-cost» ( menos de 100 ml).
Tudo isto contribui para matar a galinha dos ovos de ouro que devemos acarinhar, sem degradar o nosso património nem desvirtuar as nossas tradições, que constituem a nossa identidade cultural, que é no fundo aquilo que os turistas procuram.
O tempo do sol e praia acabou. Existem outros redutos com melhores condições para o efeito. O turismo sustentado tem de ser analisado ao longo do ano e direcionado para nichos de mercado de qualidade e com poder económico. O turismo de massas é efémero e degrada.
Viana do Castelo, 2015-04-15
Manuel de Oliveira Martins
maolmar@gmail.com
Publicado no jornal «A Aurora do Lima, n.º 16 em 2015-04-23


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